Em 17 de julho de 1975, Curitiba vivia um cenário de encanto com a segunda ocorrência de neve na história, cobrindo telhados e jardins e permitindo brincadeiras incomuns no Brasil, como bolas e bonecos de neve. No entanto, o dia seguinte, 18 de julho, reservaria uma realidade sombria para o interior do Paraná. Londrina, então conhecida como a Capital Mundial do Café, registrou a menor temperatura da história, atingindo 9 graus Celsius negativos na relva.
O resultado foi devastador. A chamada Geada Negra atingiu em cheio os vastos cafezais, matando as plantas e comprometendo a produção por anos a fio. Heverly Morais, agrometeorologista do IDR, explica as diferenças entre a geada branca, que forma cristais de gelo, e a geada negra, que, devido ao frio intenso e ventos, congela a seiva dentro da planta, provocando a morte dos tecidos.
O impacto em um estado cafeeiro
Naquele período, o café era a principal atividade econômica do Paraná, atraindo grandes produtores de diversas regiões do país. A família de Marcelo El Kadre, hoje presidente da Sociedade Rural do Paraná, é um exemplo disso. Ele conta que o avô dele veio para Londrina justamente para plantar café.
A Geada Negra é um fenômeno raro, mas não exclusivo de 1975. Contudo, aquele episódio foi particularmente marcante e deixou cicatrizes profundas na memória de quem viveu o dia. Marcelo El Kadre relembra o frio intenso daquela manhã, um "frio que matou a lavoura e congelou a esperança de muita gente".
As consequências foram trágicas e provocaram mudanças que se estenderam para além da área rural. Com a destruição das lavouras e a perda de renda, milhares de famílias abandonaram o campo em busca de sobrevivência nas cidades, em um grande êxodo rural. Caroline Oliveira Costa comenta esse deslocamento populacional massivo.
“As geadas sempre tiveram essa quebra na produção do café. Então, muitos produtores não se sentiram estimulados para continuar com a cafeicultura. Além disso, o estatuto do trabalhador rural, que foi na década de 60, veio para mudar as relações de trabalho nas colônias. A cafeicultura funcionava como colonato”, explicou.
Além da geada: a reestruturação da agricultura
É importante notar que a geada não foi o único problema enfrentado pela cafeicultura na década de 1970. Na tentativa de controlar o mercado e modernizar as lavouras, o governo federal chegou a oferecer incentivos financeiros para que produtores substituíssem os cafezais por outras culturas, como a soja e o milho. Caroline Oliveira Costa detalha esses projetos de substituição de lavouras.
“O governo incentivou a troca do café para outras culturas temporárias. Essas trocas eram mais viáveis até pelos números de exportação”, comenta.
Os números da produção cafeeira após a geada são assustadores. Mas a pergunta que fica é: foi apenas a Geada Negra que causou o declínio do café no Paraná? É justamente sobre essa questão que o próximo episódio de nossa série especial sobre os 50 anos da Geada Negra aprofundará.