Em disputa com o Rio e sob pressão dos donos da Fórmula 1, São Paulo tenta repetir a estratégia usada pela Cidade do México para renovar seu contrato com a principal categoria do automobilismo mundial e se manter no calendário como sede do GP do Brasil por mais dez anos - tempo estimado do novo acordo. Por isso, a capital paulista tem corrido atrás de investidores na iniciativa privada para bancar a taxa de promoção exigida pela F-1, chamada de "fee". Ela está estimada em US$ 30 milhões, o equivalente a R$ 123,6 milhões. O atual acordo vai até 2020.
Nos últimos meses, a procura se intensificou, sob a liderança do governador de São Paulo, João Doria (PSDB). Com interesses políticos na permanência da F-1 na cidade, Doria tem conversado com empresários de diversos setores na intenção de amarrar parceiros. Ele quer repetir com o GP expediente adotado, por exemplo, na reforma do Museu da Independência, em que tenta arrecadar R$ 160 milhões com a iniciativa privada, por meio da Lei Rouanet e de investimentos de marketing direto das empresas parceiras.
Por enquanto, a busca está sem resultados. Questionado pelo Estado sobre potenciais investidores para a F-1, o governador se esquivou. "Ainda não houve nenhum entendimento com a Fórmula 1 em relação a 'fees'. Nosso entendimento está em curso e com chances majoritárias de manter a prova em São Paulo por mais dez anos. E os entendimentos vêm sendo mantidos com a Liberty de forma reservada e construtiva."
A Prefeitura de São Paulo, que tem maior interesse nesta busca, diz desconhecer a procura por investidores. No entanto, Doria afirmou, ainda em junho, que poderia atuar em parceria com o prefeito Bruno Covas para encontrar empresários interessados em se relacionar.
"Se há uma coisa que nós dois sabemos fazer é funding no setor privado. É só comparar o Museu da Independência, em São Paulo, e o Museu Nacional do Rio. Por aí você vê qual é o caminho. Um está nas cinzas e o outro está com R$ 220 milhões em conta", disse Doria após última reunião com Chase Carey, chefão da F-1, no Brasil.
No mundo do automobilismo, a referência para São Paulo é a Cidade do México, que quase foi excluída do campeonato. Sucesso de público desde o seu retorno à categoria, em 2015, a etapa mexicana tinha o apoio do governo, que desistiu de bancar a prova. O contrato só foi renovado no início deste mês porque a prefeita Claudia Sheinbaum reuniu um grupo de empresários para pagar a taxa de promoção cobrada pela F-1.
No caso de São Paulo, os investidores podem se tornar decisivos porque a capital paulista não paga a chamada "taxa do promotor" desde a edição de 2017. O valor, estimado em US$ 30 milhões (cerca de R$ 123,6 milhões) por ano, é cobrado pela categoria para manter uma cidade no calendário do campeonato. São Paulo fez este pagamento pela última vez em 2016.
Na época, a gestão da Fórmula 1 estava sob o poder de Bernie Ecclestone. O britânico, contudo, deixou o cargo quando o grupo norte-americano Liberty Media assumiu o comando da categoria em 2017.
Desde então, Chase Carey vem enviando recados ao promotor do GP do Brasil e a outras cidades do calendário em eventos de mídia. "Acho que há alguns lugares onde não estamos recebendo o que deveríamos", chegou a afirmar o chefão da F-1 neste mês, sem citar nomes de cidades ou países. "Estamos empolgados a respeito do número de lugares que querem receber uma corrida."
Ao mesmo tempo, São Paulo enfrenta a concorrência do Rio, que pretende voltar à categoria com uma prova no autódromo a ser construído em Deodoro. Responsável principal pelo projeto, o empresário JR Pereira já avisou que tem condições de bancar a taxa anual cobrada pela F-1. "Esse ponto já foi estruturado não só para a F-1 como também para todos os eventos que nós estamos trazendo para o Brasil", disse ao Estado.
MUDANÇAS - Após assumir o comando da categoria, que não tem piloto brasileiro na pista, a Liberty Media participa pela primeira vez do ciclo de negociações de renovação de contratos com as cidades. A empresa americana tem mostrado interesse em priorizar destinos mais lucrativos, ou seja, com taxas de promoção até mais elevadas.
A postura tem colocado em risco a permanência de provas tradicionais do calendário. A Alemanha, por exemplo, recebe a categoria desde a década de 1950, mas não deve mais sediar corridas a partir de 2020. A decisão da Mercedes de não patrocinar a etapa diminuiu sua chance de renovação de contrato. De modo que destinos asiáticos passaram a ganhar força principalmente pelo compromisso dos governos locais em pagar as taxas de promoção. O Vietnã estreia na Fórmula 1 no ano que vem com um circuito de rua na capital Hanói. A Arábia Saudita também negocia para receber pela primeira vez uma prova.
DEFINIÇÃO EM NOVEMBRO - Sem prazo formal para acabar, a negociação entre a Fórmula 1 e as cidades brasileiras continua movimentada nos bastidores. Tanto São Paulo quanto o Rio garantem estar próximos de fechar acordo com a categoria. O período do iminente acerto entre as partes poderia chegar a dez anos. São Paulo tem acordo até a edição de 2020.
O Rio se respalda em documento que aponta exclusividade nas negociações até novembro. O acordo definiria a cidade como a única passível de tratar com a F-1 até essa data. Outro documento, a que o Estado teve acesso, mostra que a exclusividade dos responsáveis pela proposta do Rio é apenas válida para a cidade fluminense, e não para o País. Ou seja, São Paulo também estaria em negociação aberta com a F-1 até novembro, quando será realizado o GP do Brasil deste ano, marcado para o dia 17.
Publicamente, a categoria diz não se manifestar sobre as negociações. Questionada pela reportagem, a F-1 não descarta nada. "Não estamos acostumados a revelar detalhes sobre negociações com atuais ou potenciais parceiros", informa a categoria.
(COLABOROU PEDRO VENCESLAU)