Televisão

Nova série 'Altered Carbon' discute a imortalidade para poucos

31 jan 2018 às 06:30

"Minha esposa nunca assistiu a Star Wars", diz Joel Kinnaman, de jeito resignado. "Mas eu, em compensação, adoro ficção científica e esse universo cyberpunk. Só não me imaginava voltar a esse tema tão cedo. Muito menos voltar a fazer uma série de TV." O ator de RoboCop, naquela nova versão do policial ciborgue, reimaginada pelo brasileiro José Padilha, lançada em 2014. Kinnaman também havia encerrado sua participação na série House of Cards, da Netflix, na qual interpretava o candidato republicano à presidência Will Conway. "E, de repente, meu agente me ligou, insistiu para que eu lesse esse roteiro. Neguei de novo", conta. "E ele realmente me disse: eu sugiro que você leia essa história. Ele estava certo."

Fã desse conceito de futuro distópico - e costumeiramente perturbador - da cultura cyberpunk, o ator sueco Kinnaman é alvo fácil para Altered Carbon, a nova série que a Netflix produz e lança nesta sexta-feira, 2, na sua plataforma por streaming, baseada na série de livros de Richard K. Morgan, aqui chamada de Carbono Alterado e lançada pela editora Record. O desafio é fazer com que o seriado seja também encontrar público em alguém como Cleo Wattenström, a cônjuge do ator de 38 anos.

"Para mim", explica ele, "a força desse universo distópico é que ele mostra para qual direção a humanidade pode caminhar se seguirmos no caminho errado, com essas decisões equivocadas. Hoje, os ricos ficam mais ricos. Para onde esse tipo de coisa pode nos levar?"

A criação fantasiosa de Richard K. Morgan tem sido o motivo de obsessão da criadora Laeta Kalogridis há uma década. Produtora de Avatar (mega-sucesso do diretor James Cameron) e roteirista de filmes como Ilha do Medo e O Exterminador do Futuro: Genesis, ela usa da ideia de que o público terá os dez episódios disponíveis de uma só vez a partir de sexta-feira, para evitar entregar grandes detalhes da trama de início. Também não explica os novos termos e castas dessa sociedade de forma professoral demais logo de cara. Diferentemente do que era de costume nas séries de TV aberta ou fechada, o piloto (primeiro episódio) não entrega tanto.

A trama segue Takeshi Kovacs, um agente especial morto em combate em 2050. O Kovacs do passado, interpretado por Will Yun Lee, integrava um grupo de terrorista cujo objetivo principal era evitar a regulamentação dos cartuchos corticais, uma espécie de cartão de memória implantado no indivíduo que armazena a sua consciência, pensamentos e memórias. Com eles, as consciências podem viver para sempre, transportadas de corpo em corpo. Quando Kovacs acorda, 250 anos no futuro, se vê como Kinnaman. Sim, ele e sua trupe perderam a batalha contra a consciência digitalizada.

E, para seu descontentamento, a sociedade como ele conhecia se dividiu. Alguns poucos, os milionários conhecidos como Matusaléns, são capazes de viver para sempre em corpos novos e reluzentes. Os mais pobres, a grande maioria da população, são os mortais, ou chamados de terrenos, porque vivem na superfície do planeta, enquanto os grã-finos vivem nas alturas - temos uma metáfora bem explícita aqui. Com o uso dessa tecnologia, o abismo entre as classes tornou-se quase insustentável.

Kinnaman vive o personagem na nova fase, em adaptação a um mundo cujo tempo ele já não conhece, quando todos aqueles que ele já conheceu, conviveu e amou, morreram há tempos. E é encarregado de investigar o assassinato de Laurens Bancroft (James Purefoy, da série The Following).

"Quando sentei para conversar com Laeta (Kalogridis, a criadora da série), ela tinha tudo muito organizado na cabeça. É um universo fascinante", explica Kinnaman. "Mas não imaginava que teria a preparação física mais intensa da minha carreira", ele conta, sobre os cinco meses de trabalho físico para ganhar massa muscular e estar pronto para interpretar o grandalhão Kovacs. "A tese da série é que a ideia de se viver para sempre só esteja disponível para algumas pessoas", ele avalia. "Mas o que a série discute é que a essência do que é ser um humano é a consciência da própria mortalidade. Assim que perdemos a mortalidade, nós perdemos o que faz de nós humanos." Mas Kinnaman aceitaria implantar esse cartão de memória e ter sua consciência eternizada? "É difícil responder porque, embora a série aponte para uma direção, eu sou muito atraído pela ideia de viver para sempre."

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.