Um espaço dedicado à memória de Alberto Santos Dumont, o pai da aviação, está aberto à visitação gratuita em Foz do Iguaçu (PR). A exposição “Asas da Memória” relembra a histórica passagem do aviador pela cidade, há mais de um século, quando ele desempenhou um papel fundamental na transformação das Cataratas do Iguaçu em patrimônio público brasileiro.
Nem todo mundo sabe, mas se hoje as Cataratas pertencem ao povo brasileiro, muito se deve à coragem e à influência de Santos Dumont. Em 1916, ao visitar a região, ele se impressionou com a grandiosidade das quedas d’água e não se conformou ao saber que o local era uma propriedade particular.
Determinado, foi até Curitiba e pressionou pessoalmente o então governador do estado, exigindo providências. Pouco depois, o espaço foi desapropriado e transformado em área de preservação.
A jornalista e pesquisadora Isabelle Ferrari explica os bastidores dessa história: “Tudo indica que a Argentina já divulgava as cataratas nas grandes feiras mundiais. Então, o Santos Dumont foi a um evento de aviação no Chile e resolveu conhecer as cataratas do lado argentino. Aí, eu costumo dizer: imagina a população da Vila Iguaçu descobrindo que uma celebridade mundial — um brasileiro! — havia desembarcado do outro lado do rio. É como se o Pelé ou o Ayrton Senna estivessem ali. Eles ficaram alvoroçados e decidiram convidá-lo para ver as cataratas do lado brasileiro também. Ainda havia pouca infraestrutura, tudo era muito precário. E quando ele soube que aquela sequência de cachoeiras tinha um dono, ele não se conformou. Mudou o rumo da viagem — em vez de seguir para o Rio de Janeiro, foi até Curitiba falar com o governador para que as terras fossem desapropriadas e transformadas em área pública. Três meses depois, saiu o decreto.”
Essa história ganhou vida com a exposição instalada no Clube Gresfi, local simbólico onde funcionou o primeiro aeroporto de Foz do Iguaçu.
Asas da Memória: uma exposição em duas partes
A mostra “Asas da Memória” é dividida em duas salas temáticas. Na primeira, os visitantes encontram objetos e informações sobre os principais inventos de Santos Dumont e sua trajetória como pioneiro da aviação mundial. Já a segunda sala é inteiramente dedicada à visita do aviador às Cataratas do Iguaçu, um episódio decisivo na história da cidade e do país.
Um dos destaques do acervo é a réplica de uma mesa de dois metros de altura, inspirada em um móvel original usado por Dumont em Paris. Era nesse ambiente inusitado que ele realizava seus famosos “jantares nas alturas”. A proposta é transportar o visitante ao universo criativo e ousado do inventor, que rompeu não apenas barreiras tecnológicas, mas também sociais.
Isabelle também destaca a presença de uma estátua de Santos Dumont nas Cataratas — cuja origem poucos conhecem: “Tem uma estátua dele lá, mas a maioria das pessoas não sabe o porquê. A gente quer explicar isso. Um brasileiro mudou a história de Foz do Iguaçu. A cidade não tem uma história convencional, e é justamente isso que torna tudo mais fascinante.”
Memória viva de quem construiu a cidade
Outro momento marcante da exposição é o depoimento emocionado de Guilhermina Pastorelo, filha de pioneiros da região. Ela relembra os tempos difíceis e o amor que sente pela cidade: “Meu pai era uma pessoa que gostava muito de ler, sempre comprava jornal. Como aqui não tinha, um dia foi buscar um na Argentina. A polícia o pegou, achando que ele era espião, recebendo jornal da Alemanha durante a guerra. Mas não tinha nada a ver! Eu sou muito feliz. Me sinto privilegiada por ter nascido aqui, por ter visto essa cidade crescer, e acho que fiz minha parte.”
O acervo da exposição foi reunido ao longo de quase dez anos, com o apoio de voluntários e pesquisadores apaixonados pela história de Santos Dumont.
Visitação gratuita ao público
A exposição “Asas da Memória” é gratuita e está aberta à visitação todos os sábados, das 8h ao meio-dia, sem necessidade de agendamento. Durante a semana, as visitas podem ser agendadas por meio dos canais oficiais do projeto.
Se você está em Foz do Iguaçu ou pretende visitar a cidade, essa é uma excelente oportunidade de mergulhar na história do Brasil e conhecer o impacto de Santos Dumont além dos céus. Um verdadeiro voo pela memória nacional — sem sair do chão.