Todos os locais
Todos os locais

Selecione a região

Instagram Londrina
Instagram Cascavel
Mundo

'Movimento de Maio de 68 não queria tomar o poder'

28 mai 2018 às 06:35
Por: Estadão Conteúdo

Há 50 anos, a democracia tremeu na França. Em meio à crise política provocada pela convulsão social de Maio de 1968, Charles De Gaulle viajou em segredo de Paris em direção a uma base militar francesa em Baden-Baden, na Alemanha, e deixou para trás ministérios e instituições esvaziadas e um país à mercê de um golpe de Estado. Nessa semana crítica de 23 e 30 de maio de 1968, revolucionários de esquerda sonharam com a tomada do poder, mas a maioria dos revoltosos, inspirados pelo universitário Daniel Cohn-Bendit, não manobrou para derrubar o governo.

Cinco décadas depois, um dos militantes mais ardorosos de Maio de 68, Serge July aceitou falar ao jornal O Estado de S. Paulo com exclusividade. Cofundador do jornal Libération, ao lado de personalidades como o filósofo Jean-Paul Sartre, o jornalista moderou seu ativismo ao longo dos anos, mudando também a linha editorial do Libération, hoje um jornal de perfil social-democrata - ou "liberal-libertário", como ele define. Na entrevista, July explica que, em meio ao caos social de Maio de 68, a presidência de De Gaulle esteve por um fio, mas um golpe não aconteceu porque ninguém queria o poder.

A imagem de Maio de 1968 são as barricadas no Quartier Latin. Mas essa é só parte do movimento, não?

Houve barricadas simbólicas entre o 3 e o 10 de maio, o que permitiu aos estudantes ganhar a queda de braço. O governo reabriu as universidades e libertou os estudantes presos. Isso deu ao conjunto dos movimentos sociais muita esperança. Por isso, logo a seguir, teve início o movimento social mais importante da história da França - mais importante até do que o de 1936, a Frente Popular. A particularidade francesa é que os estudantes detonaram o movimento social.

Por que um movimento antiautoritário e libertário explodiu na França, que era um país democrático e livre?

Creio que De Gaulle encarnava uma concepção muito vertical do poder em um país muito igualitário. O lado autoritário de De Gaulle durou dez anos e as pessoas estavam cansadas. Por isso, coisas muito secundárias pesaram em Maio de 68.

O senhor afirma que existe um Maio de 68 estudantil, diferente do Maio de 68 operário. E os dois se encontram em uma greve geral. Pode explicar?

Houve três grandes episódios em Maio de 68. Um momento estudantil, que foi de março até o 13 de maio, dia da greve geral. Esse período foi concluído com uma vitória. O segundo foi a ampliação do movimento à juventude, não apenas universitária, mas também operária e assalariada. Esse momento começou em 13 de maio, com a ocupação das empresas, com 8 a 10 milhões de grevistas nas ruas. Foi um movimento popular, não uma minoria, que tomou as empresas para refletir sobre como organizar o trabalho de outra forma.

Outras notícias

Avião cai durante o pouso em aeroporto na Carolina do Norte, nos EUA; Veja o video

Israel aceita proposta de cessar-fogo apresentada por Donald Trump

Vídeo: caminhão explode em cidade dos EUA e danifica quatro casas após vazamento

E o terceiro episódio?

Em 24 de maio, após a expulsão de Daniel Cohn-Bendit, De Gaulle lançou a ideia de realizar um referendo. De imediato, ele se deu conta de que havia tomado uma decisão errada. A iniciativa criou uma tensão geral. O aparelho de Estado se fragilizou, os ministérios e órgãos da administração pararam. Havia um medo no ar. Philippe De Gaulle, filho do general, dormia junto à porta, armado, com medo do que poderia acontecer se não houvesse mais policiais para defender o Palácio do Eliseu, caso ele fosse invadido.

Mas a França esteve assim tão próxima de uma revolução?

Não, por duas razões maiores. A primeira era o fato de que os estudantes não cogitavam a tomada do poder, nem mesmo os de extrema esquerda. É preciso muita organização para fazer um golpe de Estado. O Brasil conhece bem essa história. É preciso do apoio de segmentos das Forças Armadas, de partidos políticos. Não havia isso. O movimento estudantil não tinha nenhuma ideia política além de fazer parar o autoritarismo. Jean, o neto de De Gaulle, um dia almoçou com o presidente, que perguntou: "Mas o que é que vocês, jovens, querem?". E o neto respondeu: "Queremos viver mais". Esse diálogo resume muito bem a situação. É como se o neto lhe tivesse falado em mandarim, pois a incompreensão do general era total. Só o que era claro é que ninguém, entre os jovens, tinha a intenção de tomar o poder. Lembro dos ministérios desertos. Eu estava entre os que diziam que podíamos invadi-los. Ninguém me ouvia. Assim, compreendi que o movimento não queria tomar o poder.

E qual foi a segunda razão?

A segunda razão é que o Partido Comunista e os sindicatos, em especial a CGT, eram muito contrários à União Soviética. Aliás, a URSS assegurou a De Gaulle que não estava insuflando nenhum movimento de tomada do poder. Então, havia a soma de todos esses fatores: o movimento estudantil não era favorável à tomada do poder e os sindicatos eram hostis a qualquer movimento de tomada do poder. Houve uma janela de oportunidade, um vazio do poder. De Gaulle estava desorientado pelo que se passava, não sabia como agir. Mas os estudantes e os sindicatos acabaram deixando De Gaulle livre para agir.

Foi isso, enfim, que permitiu que ele retomasse as rédeas do poder?

Sim. Houve negociações em que o governo cedeu muito. O salário mínimo foi reajustado em 30%. O que mostrou a profundidade do que se passava é que o acordo foi rejeitado. As pessoas não queriam um governo popular, mas também não queriam apenas um aumento do salário, queriam mudar a organização do trabalho. Em 30 de maio, De Gaulle convocou eleições legislativas antecipadas. Houve a manifestação dos gaullistas, que foi um sucesso. Logo, De Gaulle soube recuperar o poder - e pela via democrática, aliás.

O senhor diz que a questão não era política. Era qual?

Era cultural. Ninguém queria o poder, queria que De Gaulle parasse. O movimento de Maio de 68 era de forte conotação cultural, sobre a forma de viver, os valores, o sentido da vida, não sobre a organização política. Por isso, a tomada do poder nunca foi evocada.

Você diz que Maio de 68 foi pacifista, libertário, sem planos. Por quê?

A origem dos movimentos estudantis dos anos 60 eram os direitos civis nos Estados Unidos. Era o pacifismo, Martin Luther King. Por isso, as manifestações estudantis na França, como no exterior, não eram para tomar o poder.

Algumas publicações de esquerda na França saíram com manchetes com o espírito "à espera da revolução". Qual sua análise?

Os maiores perdedores de 1968 foram De Gaulle e, sobretudo, o Partido Comunista Francês. Eram os dois lados autoritários. Essas visões foram condenadas pelo movimento de Maio de 1968.

Veja também

Relacionadas

Mundo
Imagem de destaque

Apagão afeta toda Espanha, partes de Portugal, França, Bélgica e Alemanha

Mundo
Imagem de destaque

Papa Francisco segue melhorando, mas ficará no hospital 'por mais alguns dias', diz boletim

Mundo

Papa tem crise respiratória asmática e passa por transfusão de sangue em hospital

Mundo

Missão Polaris Dawn realiza primeira caminhada espacial comercial após adiamentos

Mais Lidas

Cidade
Londrina e região

Comércio de Londrina terá horário especial de funcionamento no período de Natal e Ano-Novo

Cidade
Londrina e região

Homem de 28 anos morre em confronto com equipe da Polícia Militar na zona norte

Cidade
Londrina e região

Menino de 4 anos luta pela vida após ser atropelado por caminhão em Londrina

Cidade
Londrina e região

Jovem de 19 anos é esfaqueada pelo ex-namorado de 16 anos em tentativa de feminicídio

Paraná
Paraná

Médico de 38 anos morre após salvar filhas de afogamento em Matinhos

Podcasts

Podcast Arte do Sabor | EP 3 | Como comprar azeite Andorinha online?

Podcast Pod Fala com a Tai | EP 8 | A Jornada Empreendedora | Karol Moreira

Podcast Café Com Edu Granado | EP 43 | Disciplina e Superação | Junior Zampar

Tarobá © 2024 - Todos os direitos reservados.