Três policiais civis acusados de envolvimento na morte do menino João Pedro Mattos Pinto, de 14 anos, serão levados a júri popular. A decisão foi tomada por unanimidade nesta terça-feira (24) pela 6ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ).
João Pedro foi morto com um tiro de fuzil nas costas dentro da casa da família, no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, na região metropolitana do Rio de Janeiro, em 18 de maio de 2020. Na ocasião, havia uma operação conjunta das polícias Civil e Federal.
Investigações apontaram que o disparo que matou o garoto partiu da arma de um dos policiais. A casa do tio, onde João Pedro brincava com outras crianças, ficou com mais de 70 marcas de tiros.
Em julho do ano passado, os policiais da Core Mauro José Gonçalves, Maxwell Gomes Pereira e Fernando de Brito Meister haviam sido inocentados pela 4ª Vara Criminal de São Gonçalo.
Entretanto, o Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) e a Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro (DPRJ) recorreram da decisão, alegando que a absolvição ignorou provas técnicas e testemunhais robustas, além de laudos de peritos independentes.
Segundo o MPRJ e a Defensoria, a decisão também contraria determinações da Corte Interamericana de Direitos Humanos e do Supremo Tribunal Federal (STF), que exigem investigações imparciais em casos que envolvem agentes do Estado.
A denúncia do MPRJ afirma que os acusados assumiram o risco de matar um inocente ao atirar “em direção a uma residência com vidros espelhados, sem visibilidade de quem estava no interior”. A perícia da Polícia Civil não comprovou disparos vindos de dentro da casa, afastando a hipótese de legítima defesa.
Pressão popular
Desde o crime, parentes e organizações sociais têm feito manifestações pedindo por justiça. No último dia 20 de maio, o relator do processo no TJRJ, desembargador Marcelo Castro Anátocles da Silva Ferreira, e a desembargadora Adriana Ramos de Mello votaram por aceitar o pleito do MPRJ. Mas o terceiro desembargador, Cezar Augusto Rodrigues Costa, pediu vistas do processo e o julgamento foi suspenso.
Nesta terça-feira, data marcada para o retorno da apreciação, a família de João Pedro e ativistas fizeram uma manifestação em frente à sede do TJRJ. No julgamento virtual, o magistrado Rodrigues Costa também se pronunciou em consonância com o relator do caso, determinando assim que a absolvição seja anulada e os três policiais civil vão a júri popular.
O TJRJ informou à Agência Brasil que não há previsão de quando será o novo julgamento.
Alívio
A decisão de levar os acusados ao júri popular foi comemorada pelos parentes de João Pedro. A mãe de menino, Rafaela Mattos, disse que a decisão "traz um alívio muito grande ao coração".
O defensor público Pedro Carriello, responsável pelo caso, classificou o recurso atendido como “uma vitória”. Para ele, a importância da decisão está na possibilidade de que o Tribunal do Júri julgue os policiais civis, “tendo em vista que existem diversas provas técnicas, periciais e testemunhais de que não houve legítima defesa”.
“É uma decisão de suma importância, ela fortalece a luta pelos direitos humanos, contra a violência policial e reforça a ideia da memória do caso João Pedro, que é de suma importância para todos nós”, disse o defensor, em nota.
Júri popular
O Tribunal do Júri ─ também conhecido como júri popular – é um órgão especial da Justiça previsto na Constituição para casos de crimes dolosos (quando há intenção) contra a vida, como homicídio, tentativa de homicídio e feminicídio.
O destino dos réus é decidido por jurados escolhidos entre “pessoas comuns”. É uma forma de compartilhar o julgamento com a sociedade.
No júri, acusação e defesa expõem argumentos para convencerem os jurados de que os réus são culpados ou inocentes.
Outros recursos negados
Além de exigir júri popular, a Defensoria Pública tinha pleiteado aumento no valor da ação indenizatória concedida à família de João Pedro; tratamento multidisciplinar de saúde mental e o fornecimento de medicamentos para os pais do adolescente; pedido formal de desculpas do Estado e a criação de um memorial em homenagem à vítima. Os pedidos não foram acolhidos.