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Butantan quer criar vacina contra gripe aviária em humanos

21 ago 2024 às 12:14

O Instituto Butantan, órgão vinculado à Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, submeteu o pedido à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para iniciar uma pesquisa clínica com uma candidata à vacina contra a gripe aviária. O ensaio clínico de fase 1 e 2 da vacina influenza monovalente tipo A (H5N8), desenvolvida no Instituto, pretende comprovar a segurança e a imunogenicidade (capacidade de gerar anticorpos) do imunizante. O Butantan fez testes pré-clínicos e já tem disponível um lote reserva para a pesquisa clínica.


“Ter uma vacina pronta, com uma plataforma já testada, que mostra que produz anticorpos, é o objetivo do Butantan. Não é para já comercializar, mas para propor um estoque estratégico. Caso o Ministério da Saúde precise acionar, o Butantan estará pronto para fornecer”, declara o diretor do Instituto Butantan, Esper Kallás. “Não só estamos trabalhando nesta vacina candidata, como também estamos desenvolvendo uma rota tecnológica que pode ser trilhada, caso o vírus mude”, continua Kallás.


“Vamos pedir uma autorização para a Anvisa para a condução dos estudos clínicos, ou seja, em humanos voluntários. Trata-se de uma vacina desenvolvida pelo Instituto Butantan para se preparar para uma possível situação de necessidade”, afirma o diretor de Assuntos Regulatórios, Qualidade e Ensaios Clínicos, Gustavo Mendes.


O pedido está amparado na aprovação de uma Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) da Anvisa, que dispõe sobre o registro de vacinas pré-pandêmicas contra a influenza no país. No pedido, há dados dos estudos pré-clínicos (em modelos animais), dados técnicos da produção do lote reserva, informações sobre a composição do imunizante e seu adjuvante, como as vacinas estão armazenadas no Instituto, entre outros detalhes.

“É a primeira vacina que está sendo submetida a partir dessa resolução no Brasil. O Butantan está sendo inovador trazendo essa proposta para o Brasil”, reitera Gustavo. 


A escolha em produzir uma vacina a partir da variante H5N8 foi estratégica, por se tratar de um vírus de alta patogenicidade, que pode causar graves problemas respiratórios em humanos, inclusive levar à morte. A taxa de letalidade por influenza aviária em humanos é de 53%, ou seja, pode matar mais da metade dos infectados, segundo a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS).


O que é o vírus da gripe aviária? 


A influenza aviária é conhecida mundialmente como influenza A viroses, ou pela sigla IAV. Os vírus influenza A têm subtipos com base em diferenças antigênicas de duas proteínas de superfície: hemaglutinina (HA) e neuraminidase (NA). Existem pelo menos 16 subtipos de HA e 9 de NA reconhecidos como de origem aviária, que dão origem aos subtipos da influenza A, como H5N1, H9N2, H3N8, entre outros.


As aves são hospedeiros naturais da influenza aviária, principalmente as aves aquáticas selvagens, como gansos, pelicanos e garças. Em suas migrações, elas contraem e espalham o vírus, o que explica por que ele surge em diferentes lugares do mundo e em diferentes subtipos. O vírus é excretado por aerossóis respiratórios, muco e fezes da ave infectada e, por isso, mesmo aves domésticas, como as galinhas, perus e galinhas d’angola, podem se infectar se tiverem contato.


Há relatos também de infecção em mamíferos, como leões marinhos, focas, golfinhos e lontras. Em galinhas, a influenza A causa uma grave hemorragia em até 24 horas, dizimando plantéis inteiros.


Doença com potencial pandêmico


Embora afete sobretudo aves selvagens e domésticas, a gripe aviária pode infectar humanos. Do ano passado para cá, a OMS contabilizou 13 novas infecções humanas por influenza aviária relatadas no Camboja, China e Vietnã, além de uma na Austrália e outra no México. Em junho, a OMS confirmou uma morte de uma pessoa pela variante H5N2 no México.


Desde 2022, novas variantes do vírus passaram a circular na América do Sul, inclusive no Brasil, levando à morte de aves e alguns mamíferos aquáticos. Foi isso que aumentou o alerta sobre a doença na região. O Instituto Butantan analisou as sequências genéticas dos vírus circulantes na América do Sul para escolher a vacina candidata que está sendo desenvolvida. O Butantan incluiu vacinas com a cepa H5N1 nos ensaios pré-clínicos, por também se tratar de uma variante altamente patogênica, permitindo uma mudança de cepa caso essa variante se espalhe.


A transmissão entre humanos da gripe aviária, considerada esporádica, ocorre após contato próximo com a ave infectada e/ou suas fezes. A forma de transmissão mais plausível é o contato com as penas, pele, mucosas e aerossóis, isto é, pela manipulação do animal infectado vivo ou morto – este último na manipulação em frigoríficos, por exemplo – e depois de encostar a mão contaminada nos olhos, nariz ou boca, segundo a OMS.


O surgimento de casos em humanos preocupa cientistas pelo alto potencial de transmissibilidade do vírus, e pela gravidade dos sintomas, que podem variar de uma conjuntivite com sintomas leves de gripe a uma doença respiratória aguda grave, levando à morte. No Brasil não há casos registrados da doença em humanos, mas houve notificações em aves de subsistência (galinheiro doméstico). Desde maio de 2023, o Ministério da Agricultura e Pecuária decretou emergência zoossanitária por causa da influenza aviária no país.