A principal preocupação do governo brasileiro em relação à crise na Bolívia é a possibilidade de interrupção no fornecimento de gás natural. Os bolivianos fornecem cerca de 30% de todo o gás consumido no Brasil. O temor das autoridades brasileiras é de que a situação política saia de controle e o fornecimento de gás seja interrompido.
Desde a renúncia de Evo Morales, no domingo, 200 manifestantes ligados ao Movimento ao Socialismo (MAS), partido do ex-presidente, invadiram e paralisaram a produção de apenas uma usina de gás natural no campo de Carrasco, Província de Chapare, Departamento de Cochabamba, um bastião dos apoiadores de Morales.
A estatal boliviana, Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos (YPFB), enviou na terça-feira, 12, uma carta ao governo da Argentina notificando que o fornecimento de gás pode ser afetado em razão das "limitações" atuais da usina de Carrasco. As Forças Armadas da Bolívia já retomaram o controle das instalações, mas a usina ainda opera com a metade da capacidade.
O impacto para o Brasil por enquanto é zero. Os campos operados pela Petrobrás, no sul da Bolívia, ficam em uma região relativamente tranquila. No entanto, existe o temor de que uma instabilidade política prolongada leve a ações de extremistas em outros campos, o que poderia afetar o fornecimento para o Brasil.
Desde o início da crise, pelo menos quatro empresas estrangeiras que operam campos na Bolívia suspenderam suas atividades de exploração em razão do temor de reações por parte dos militantes de ambos lados da disputa política.
O fato de a Bolívia estar acéfala desde a renúncia de Morales também preocupa. Evo, o vice-presidente, Alvaro Garcia Linera, os presidentes da Câmara e do Senado renunciaram diante das denúncias de fraude eleitoral, pressão dos militares e manifestações violentas da oposição, deixando um vazio de poder.
Enquanto as autoridades buscam uma saída constitucional, a Bolívia é governada por uma junta militar.
Segundo fontes do setor energético, o consumo brasileiro de gás boliviano está próximo do teto de 31,5 milhões de m3/dia em razão da seca dos últimos meses que reduziu consideravelmente o volume de água nos reservatórios das hidrelétricas brasileiras.
Quase todo o gás boliviano é destinado a indústrias e usinas termoelétricas. Existem outras opções de fornecimento, como o Gás Natural Liquefeito (GNL), exportado principalmente dos EUA. No entanto, a substituição pode levar algum tempo e ter impacto nos preços da energia. "Não há risco de desabastecimento, mas a diminuição da oferta pode ter impacto nos preços", afirmou Alexandre Lopes, diretor técnico da Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia Elétrica (Abreceel).
Além disso, a crise ocorre no momento em que a Petrobrás e a YPFB tentam implementar a venda de 51% do Gasbol, rede de distribuição de gás boliviano com mais de 3 mil quilômetros de extensão, 85% deles em solo brasileiro, parte do acordo da Petrobrás com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) para a abertura do mercado de gás natural em diversos Estados brasileiros. "Os últimos acontecimentos na Bolívia jogam um balde de água fria na negociação entre a Petrobrás e a YPFB, restando ao investidor aguardar o desenrolar do cenário nos próximos dias", disse Ernani Reis, analista da Capital Research.
Paralisação. Ontem, o diretor de relacionamento institucional da Petrobrás, Roberto Ardenghy, admitiu que as renegociações de contratos de importação de gás natural entre a Petrobrás e a YPBF estão paralisadas, mas garantiu que o Brasil tem uma reserva estratégica estimada em pelo menos seis meses. (Colaborou Mariana Durão)
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.