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Dez anos sem Zilda Arns

19 jan 2020 às 12:51
Por: Redação Tarobá News

Tive o privilégio de conhecer Dra. Zilda Arns pessoalmente e as lembranças que ela desperta, em mim, são muito vívidas: sua personalidade cativante estimulava nas pessoas, o que ela própria uma vez chamou de “mística fraterna de construir um mundo melhor” – aquela face positiva do ser humano que faz da solidariedade um sentimento tão poderoso, capaz de unir a sociedade em torno das causas mais difíceis.

Me vêm a lembrança a sua ativa participação na Assembleia Legislativa, na aprovação da Lei estadual Antifumo em 2009. Por incrível que possa parecer nos dias de hoje, houve resistências à proposta, mas elas foram contornadas graças ao trabalho incansável da Dra. Zilda, que foi aos gabinetes conversar com cada um dos deputados que resistiam ao nosso projeto e persuadi-los da necessidade de sua aprovação. E usando um argumento tão simples quanto convincente: “A sociedade avança quando cria leis que protegem a saúde”, dizia ela. A lei paranaense se tornou referência e logo depois Dra: Zilda deflagrou uma grande mobilização para que o texto fosse aprovado em outros estados e também em Câmaras Municipais.

Zilda Arns, como todos sabem, tornou-se conhecida mundialmente por sua iniciativa na criação da Comissão Pastoral da Criança, vinculada q Igreja Católica. Trabalho que ela começou praticamente sozinha, em 1983, em Florestópolis. Logo apareceram resultados e em pouco tempo ela tinha o apoio de governos, das igrejas de todas as denominações  e, sobretudo, de um imenso voluntariado.  

Se hoje a fome e a desnutrição não atingem mais as crianças brasileiras de forma endêmica, em grande parte isso se deve à contribuição da Dra. Zilda e da Pastoral que ela própria criou – ainda há muito a ser feito em nosso País, mas Zilda Arns apontou um atalho que salvou centenas de milhares de vidas, inclusive com soluções prosaicamente simples, como o soro caseiro, que garantiu a sobrevivência de muitas crianças e adolescentes vítimas de diarreia e outras doenças infecciosas, como já vinha fazendo em países ainda mais pobres que o Brasil.

Como médica sanitarista (graduada pela Universidade Federal do Paraná em 1959) e membro de uma família religiosa impregnada de fraternidade, Zilda Arns uniu ciência e fé para salvar vidas e tornar melhor a vida dos brasileiros. Não é exagero dizer que a Pastoral da Criança também tem um imenso crédito na extraordinária redução das taxas de mortalidade infantil verificada no País nos últimos 30 anos.

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Todo este trabalho, como não poderia deixar de ser, foi reconhecido na ONU e em muitos países. Ela passou a correr o mundo ensinando suas fórmulas simples e eficazes de combater a fome e a miséria, em palestras, ações solidárias e missões humanitárias.

Sua última missão foi no Haiti, onde dona Zilda pereceu sob os escombros de um terremoto absolutamente catastrófico, que matou mais de cem mil pessoas e deixou 1,5 milhão de flagelados. Toda essa tragédia naquele que é o país mais pobre do mundo.

Zilda Arns morreu fazendo aquilo que mais amava em sua vida tão profícua e produtiva: cuidando de pessoas, ensinando como cuidar delas e, acima de tudo, fazendo renascer a esperança naqueles que já não tinham quase mais nada com que contar.

Ela nos deixou no dia 12 de janeiro de 2010. Apenas uns poucos meses antes, entre agosto e setembro do ano anterior, havíamos trabalhado de mãos dadas na aprovação da citada lei antifumo – o que tornou ainda mais difícil, para mim, absorver o duro golpe da notícia de sua morte.

Mas fica a lembrança terna do ser humano que despertava, em cada um de nós, os nossos melhores sentimentos: de amor, fraternidade e empatia com aqueles que mais precisam de nosso amparo. Referências que busco imprimir na minha vida de homem público.


Luiz Claudio Romanelli, advogado e especialista em gestão urbana, é deputado e vice-presidente do PSB do Paraná

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